O Peso dos Olhares: Desafios Contemporâneos na Luta Racial.

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Existe uma guerra, travada entre os filhos daqueles que foram expurgados de suas terras e trazidos como escravos e os filhos dos escravizadores. Uma guerra que não é só manifesta em assassinatos em massa da população negra, mas uma guerra que acontece na estrutura do sistema, no campo dos olhares e do conhecimento. Guerra de perseguições acadêmicas e ideológicas, onde se impõe o estranhamento da imagem de um negro pensante. O colocam em um lugar de trabalho, fazendo algo que maltrate seu corpo, seu espírito, deixando livre a expressão do pensamento para quem tem o direito de pensar. A maioria dos negros ainda sucumbe diante desta ideia, na maioria das vezes de forma inconsciente e pressionada pela própria comunidade onde vive. O garoto sentado fora do barraco lendo é indagado pela mãe: “Isso não vai trazer comida para casa, faz algo útil.” Ele sai de casa e busca uma atividade, faz o que os amigos estão fazendo, trafica, rouba, o que for mais fácil e possível no momento. Alguns considerados rebeldes conseguem sair de seu lugar para poder estudar. Ao entrar na catedral do conhecimento eles sentem a pressão ao terem que entender um filósofo importante, branco, burguês, que discursa sobre uma tal de moral. “Moral é não ter fome”, pensa o jovem estudante que pega três ônibus lotados, se molha na chuva e ainda precisa escutar que todos têm a mesma oportunidade. O estudante negro não entende o magnetismo que o empurra para fora da cadeira sempre que resolve escrever. Não entende o olhar de repúdio do professor ao receber um artigo apontando as falas racistas dos grandes pensadores brancos da história, aqueles que são os pilares do conhecimento. O olhar negro busca alguém como ele que tenha “vencido na vida”, mas não encontra referências para seguir, não que elas não existam, apenas não são validadas e quando são, é porque aderiram a toda a estética da cultura branca. Alisa seu cabelo que não está certo, opera seu nariz que é diferente, se puder mude sua cor que está errada. Os transgressores que surgem são sempre experimentais, loucos, com falta de técnica. “Leia mais, estude mais, corra mais, assim, caso seja o melhor entre os melhores, talvez te deixemos falar sobre a visão do negro.” A voz que cala quer falar sobre ciência, sobre literatura, sobre escravidão, sem curvas nas palavras e sem ser colocado em uma caixa catalogada: “preto falando”. Isso vale para as mulheres negras, que, além de terem seu lugar de fala impedido, são obrigadas a lidar com o sexismo, com o fato de serem colocadas no quartinho da empregada, mudas, com apenas o direito de servir. Se partimos para o universo do negro-intelectual LGBTQIA+, seu espaço é apenas a raspa da tigela, ocupado com uma forte determinação em propiciar a mudança para seus netos, quem sabe, bisnetos, porque a esperança de uma mudança para si, é vaga; estamos perto demais da época dos colonizadores que continuam matando, fazendo questão de segurar seus lugares privilegiados. O mundo anda devagar para os oprimidos. O azar da estrutura branca é que a alma negra é dura, com raízes profundas, benzida com muito sangue. A luta de Zumbi ainda pulsa em nossas veias. Os territórios estão sendo conquistados aos poucos, com seus soldados andando de cabeça erguida, cabelos expostos, orgulhosos de seus caminhos, de seus calos, de sua pele queimada do sol. Em um país de maioria negra, a luta pela igualdade não pode cessar. A guerra dos olhares a cada dia tem pessoas mais preparadas, que investem em seu letramento racial, que aprendem a devolver o olhar em forma de denúncia, exposição e coragem, para que o tronco deixe de existir. A transformação real não ocorre apenas em grandes manifestações públicas, mas também no dia a dia, nas pequenas batalhas e conversas difíceis. Salve a educação, a empatia e a construção de pontes, em vez de muros. Buscamos nos informar, estudar a história e a cultura negra, reconhecendo que o conhecimento é uma das principais armas na luta contra a ignorância e o preconceito. A conscientização é uma jornada constante, é preciso liberar as vozes daqueles que foram historicamente silenciados. À medida que mais pessoas se unem a essa causa, a guerra dos olhares se encaminha para uma diluição pacifica. Cultivemos a esperança de que, com o tempo, a discriminação racial seja erradicada e que as chibatadas de ódio, sedam lugar para o carinho, o respeito e a união de todos os conhecimentos, que já transmutados em sabedoria, nos transforme novamente em um único corpo, o humano.

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